Manifestantes prenderam balsas de madeira exigindo maior fiscalização e regularização da terra

Fotos: Timo Santala

Manifestantes marchando na praia em frente de São Pedro

Dia 22 de outubro, nove horas da manhã. Depois de uma viagem de voadeira de quatro horas chegamos na ponta de areia em frente à comunidade de São Pedro, no rio Arapiuns. A praia, decorada com bandeiras brancas, hospeda cerca de 300 pessoas vindas de 27 comunidades da Reserva Extrativista Tapajós/Arapiuns, do PEAEX Lago Grande e da Gleba Nova Olinda. Os ribeirinhos entram no décimo-primeiro dia de manifestação. Vieram de canoa, rabeta e barco comunitário para protestar contra a exploração ilegal de madeira na área e para exigir do Governo Estadual do Pará uma maior fiscalização da madeira e a regularização fundiária da Gleba Nova Olinda. Os manifestantes contam com o apoio de entidades como o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Santarém (STTR), a Federação das Associações do Lago Grande (FEAGLE) e a Tapajoara-RESEX. Atrás da ponta de praia, estão duas balsas com madeira e duas balsas vazias, prendidas pelos próprios comunitários. Depois de muitos anos de negociação pelos direitos à terra, e de ver de cinco até dez balsas de madeira saírem da região por semana, chegou o limite para o povo do Arapiuns. Danilson, liderança do povo Borari da Aldeia Novo Lugar, resume o sentido da manifestação: “O governo atual é que nem mocotó. Só vai sob pressão”.

Ordenamento territorial

O momento da manifestação não é coincidência: as Glebas do rio Arapiuns estão em pleno processo de ordenamento territorial. Em junho, a Governadora Ana Júlia decretou sete Projetos Estaduais de Assentamento Sustentável (PEAS) e três Projetos de Assentamento Estaduais Agroextrativista (PAEAX) na área. A proposta faz parte do plano do Governo Estadual para criar novas unidades de conservação, áreas de uso e manejo comunitário e áreas para concessão florestal. No Decreto foram incluídas as PEAEX de Aruã e outra de Vista Alegre do Maró, ambos conectados ao Rio Arapiuns. Por entanto, no último caso as comunidades de Prainha e Vista Alegre do Maró reclamaram que a área destinadas a elas foi muito menor do que aquilo que haviam reivindicado nas audiências públicas e no processo de discussão a Limitação Administrativa Provisória – LAP, que decolou este processo. “O que foi proposto pelas comunidades, no caso da Prainha e da Vista Alegre do Maró, foi entorno de 25 mil hectares. Mas ela foi apenas decretada com 5 mil 719 hectares”, afirmou Manoel Edivaldo dos Santos Matos, do STTR. Nas demais regiões das Glebas Mamuru-Arapiuns, como a região de Mariazinha e as áreas de comunidades indígenas, o processo ainda aguarda a decisão do Governo.

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Fiscalização

A maior indignação dos manifestantes é com a falta de monitoramento e de não levar em prática as decisões que foram colocados no papel pelo Governo do Estado. Dinael Cardoso, membro do comando da manifestação explica: “ Nós não temos nada em contra dos funcionários da empresa madeireira, mas estamos contra os planos de manejo que foram feitos. A maior vergonha é que os nossos órgãos ambientais na cidade de Santarém, tanto municipal como estadual e federal, não fiscalizam essas balsas”. Danilson concorda: “O governo já aprovou planos de manejo aqui na região sem conversar com as pessoas daqui. A madeira está sendo levada enquanto os verdadeiros donos que somos nós, que nascemos aqui, vemos passar na nossa frente nossas riquezas indo embora”.

Apesar da indignação dos manifestantes, o protesto é pacífico. A praia é cenário de debates, palestras educativas e futebol, e conta com uma cozinha solidária. A rádio comunitária de São Pedro, vinculada à Rede Mocoronga de Comunicação Popular do Projeto Saúde e Alegria, toca músicas regionais e notícias. Entre os manifestantes se encontram crianças, idosos, jovens e mulheres. O ambiente é de união e paciência.

Negociações

No dia 21 de outubro, essa paciência foi recompensada com a visita da Secretaria Estadual do Meio Ambiente e do Instituto de Desenvolvimento Florestal do Estado do Pará – Ideflor. Depois de negociações, os manifestantes concordaram em deixar as balsas vazias voltarem para Santarém. Porém, as balsas de madeira ficaram no Arapiuns. “Ontem o chefe da Fiscalização do Governo do Estado disse que ele era consciente que dentro dessa balsa que está aqui presa conosco tem mais da metragem da madeira autorizada, mas que ele não pudia medir esta madeira por que não tinha pátio”, relata Dinael. Os manifestantes exigem que a madeira que está nas balsas seja identificada e medida na própria comunidade de São Pedro, juntos com os comunitários do movimento. Em caso de encontrar irregularidades, os manifestantes propõem que a madeira seja doada às comunidades do Rio Arapiuns.

Balsas apreendidas pelos comunitários

Além dessa proposta, os manifestantes querem que sejam cancelados os planos de manejo da Gleba Nova Olinda, e que seja feita a  regularização das terras indígenas do Maró com a demarcação feita pela FUNAI e o Governo do Estado. Outra proposta dos manifestantes é fazer a doação das madeiras derrubadas pelas empresas na Gleba Nova Olinda, criando um fundo de reserva de benefício através de leilões por uma parte, e por outra parte  para as comunidades afetadas pelas enchentes do município de Santarém. As propostas são incluídas num documento, que está sendo enviado à Santarém.

Na nossa despedida dos manifestantes, o sol já estava se pondo acima do rio. O povo do Arapiuns passará mais uma noite dormindo na praia em frente de São Pedro, na espera de novas negociações. Os defensores da floresta continuam com o protesto pacífico, em prol da preservação do meio ambiente e dos direitos dos ribeirinhos. Danilson tem confiança que a manifestação não será em vão:“Não somos bestas não, somos cidadães brasileiros. Sabemos revindicar os nossos direitos”.